Grupo entrega trabalho original, verdadeiro e instigante
De início, o som do grupo Scalene composto por Gustavo (guitarra e voz), Tomás Bertoni (guitarra e teclado), Lucas Furtado (baixo) e Philipe “Makako” (bateria e voz), é algo marcante. Se você já ouviu alguma vez qualquer uma de suas músicas, você irá reconhecê-los, seja pelas nuances vocais de Gustavo, seja pelos timbres presentes em cada uma de suas faixas.
Mas além disso, qualidade técnica e sonora é algo fundamental, detalhe que magnetite, o novo disco do grupo, mantém em destaque. Com uma mistura interessante entre alguns dos elementos já conhecidos da discografia do Scalene em conjunto com temperos sonoros brasileiros, esse é um projeto corajoso e original. Tomás, em entrevista ao O Globo, comenta que “O modo grego mixolídio, por exemplo, é muito usado no rock e é parte essencial dos ritmos nordestinos”. E da necessidade de realizar uma mistura que valorizasse a música brasileira, o grupo começou a pensar em como fazer a inserção desses dois pontos em músicas que colocassem esses universos para conversar.
E o álbum começa muito bem com “extremos pueris” que já mostra uma mistura delicada entre peso, distorção, calma e sonoridade limpa, colocando em evidência o trabalho interessante entre síncopes e quebras de tempo que fazem da faixa um momento de total alerta para o ouvinte, sem que nenhum momento se torne desnecessário. magnetite segue com “ponta do anzol”, novamente com momentos de calma entrecortados por instantes instigantes que posteriormente conduz para a balada introspectiva “cartão postal”.
“esc (caverna digital)” coloca o tempero sonoro brasileiro em evidência e banca a aposta do grupo por caminhos sonoros realmente inusitados, principalmente para ouvintes desavisados que aguardavam algo próximo do que a banda havia lançado anteriormente. Esses detalhes tornam a música em algo ainda mais interessante graças a transformações que fazem com que a faixa empolgue em qualquer situação.
“distopia” traz uma abordagem direta e honesta sobre a temática dos falsos profetas, religiões e tudo que permeia este tema. E aqui, o principal detalhe é encontrar um grupo de rock nacional - em plena expansão midiática - fazendo o que o rock costuma/va fazer: Colocar o dedo na ferida, falando sem medo sobre temas delicados. Só por isso o disco já merece todo o crédito possível, afinal de contas, já faz um tempo que nenhuma banda brasileira - do que podemos chamar ‘mainstream’ - fala de forma aberta sobre assuntos polêmicos. O rap e até mesmo alguns artistas pop têm feito isso de forma muito mais instigante, mas parece que o Scalene veio com a vontade necessária para, a partir de agora, se inserir nessa realidade. “frenesi” surge como uma faixa de toada despretensiosa, mas ganha nuances e gera interesse graças à quebrada rítmica, cheia de síncopes que surpreendem de maneira muito boa todo seu percurso. Aposta diferente que coloca em evidência a ideia da banda de levar suas possibilidades para um patamar realmente distinto do que já vinham mostrando.
“maré” é outra aposta calma, enquanto “fragmento” - mais uma vez, coloca a sonoridade brasileira em destaque sem deixar de lado a pegada forte e roqueira do Scalene, o que gera uma excelente mistura. “trilha” e “velho lobo” funcionam como complementos para a tracklist do grupo, com começos tranquilos e misturas instrumentais que conduzem as faixas para um lugar um pouco ‘distante’ do resto do disco. Porém, está longe de ser algo ruim.
magnetite caminha para seu fim com mais duas excelentes canções, “heteronomia” que é construída de forma crescente, ganhando elementos sonoros que culminam com a explosão vocal de Gustavo, que alterna de forma realmente interessante seus momentos mais calmos e seus vocais mais próximos de um show para quem busca pular, gritar e liberar seus demônios. E então surge “phi”, o encerramento perfeito de um trajeto que é capaz de manter o interesse do ouvinte durante toda a sua ‘extensão’. Com início delicado e versos inspiradores, a música te coloca em um momento de paz.
Assim, Scalene se mostra como uma banda corajosa no Brasil de hoje, com letras verdadeiras, sonoridade instigante e que conduz o ouvinte por diversos momentos, graças à entrega de algo novo, mas com assinatura. Isso tudo em conjunto com muita verdade, sem que pareça engessado ou pensado para se encaixar em uma fórmula que busca chegar a um público maior. E no fim das contas, é disso que a música é feita, verdade que gera crescimento orgânico, algo que deve colocar o Scalene - muito em breve - no panteão das bandas brasileiras para serem lembradas por um público contemporâneo que busca o tempo todo se identificar com algo que soe real, único e próximo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário